Fortaleza-logística e seus telhados metálicos: infraestruturas de circulação de mercadorias
Data da publicação: 17 de novembro de 2025 Categoria: CRÔNICIDADES
Por: Carlos Wesley Freire da Silva
Certa manhã, estou tomando café, e no portão alguém grita: “ENTREGAAAAA!”. Fico impressionado: o produto que comprei ontem, com apenas alguns cliques, chegou à minha casa um dia depois da compra. Lembro-me de quando comprei minha primeira blusa da Taylor Swift e do quanto fiquei ansioso por pelo menos sete dias até ela chegar. Surpreende-me a rapidez que tomou o lugar dos dias intermináveis que um produto levava para chegar até mim. “Parece que a logística finalmente chegou a Fortaleza”, penso. É como se os produtores da The Eras Tour, que levavam as enormes estruturas do show da Taylor para a cidade seguinte em dois dias, tivessem assumido o controle dos sistemas logísticos da capital do Ceará. Rio sozinho ao lembrar que swift significa rápido em inglês.
O pensamento, preso em minha mente inquieta, faz com que eu comece a observar a cidade sob um olhar analítico, em busca do que teria mudado para que as minhas entregas agora chegassem tão rápido. “Centro de distribuição da Amazon!”, grito em tom de descoberta e dúvida sanada. Instalado nos arrabaldes de Fortaleza, o CD, como é chamado esse tipo de estrutura, funciona como uma estante cheia daquilo que eles “sabem” que eu quero. Meus dados e os cliques nos produtos que mais me chamam atenção ficam guardados em uma nuvem digital, servindo de estatística para saberem quais são os itens mais procurados — seja por mim, por você ou por outras empresas. Tudo isso contribui para a eficiência do CD da Amazon, que tem um catálogo de 50 milhões de produtos no Brasil e chega a processar cerca de 90 mil itens por dia na região metropolitana de Fortaleza.
Ao passar pela BR-116, já me afastando da mancha urbana, começo a perceber algo diferente. A via é duplicada, larga e cheia de caminhões passando, principalmente aqueles que carregam contêineres. As estruturas com telhados de metal, assim como o CD da Amazon, começam a ser maioria em suas margens, tomando o protagonismo das moradias tradicionais de telhados de cerâmica cor laranja, vindas dos solos argilosos de alguma planície fluvial. Abro o aplicativo de mapa no celular. A imagem de satélite confirma: a BR-116 e a rodovia do 4º Anel Viário, vistas de cima, parecem duas serpentes cintilantes, com os telhados metálicos dos CDs formando os padrões de suas escamas. Ambas seguem caminhos distintos. A primeira direciona-se para o sul do país, interligando Fortaleza à selva de pedra chamada São Paulo, cidade mais polarizadora segundo a REGIC. A segunda segue para o oeste, em direção ao Porto do Pecém — o que explica a grande quantidade de contêineres, parecendo caixinhas de presente numa esteira em direção ao mar.
Movo o mapa e percebo que o complexo industrial também apresenta muitos telhados de metal, fazendo-me acreditar que isso é um padrão das estruturas logísticas. Do alto, também consigo ver as caixinhas no pátio, prontas para serem colocadas em navios que irão para algum outro país. De janeiro a dezembro de 2024, o Porto do Pecém movimentou cerca de 19.652.312 toneladas. Em operação desde 2001, quando o governo estadual e o Ministério dos Transportes assinaram o Contrato de Adesão nº 091/2001, o porto vem quebrando cada vez mais recordes em suas exportações.
Olhando com mais cuidado, principalmente sob a ótica da logística empresarial nascida nos anos 1980, Fortaleza me é percebida como uma guerreira de ponta, cheia de lógica, razão e vantagens. É a capital mais próxima, simultaneamente, da África, da América do Norte e da Europa. É dotada de dois portos — Mucuripe e Pecém —, sendo este último um porto offshore, capaz de receber navios maiores. Distritos industriais, implementados por políticas públicas em sua região metropolitana, garantem um novo lar para as indústrias que saíram da Avenida Francisco Sá. Seu litoral é plano, servindo de porta de entrada dos cabos submarinos mundiais, contendo 17 cabos — mais do que a soma dos cabos das outras cidades brasileiras. Seu aeroporto é hub da empresa Mercado Livre, empresa de logística e principal adversária da Amazon na guerra do comércio eletrônico, com três voos semanais voltados à distribuição de mercadorias.
Depois de muito observar e estudar, consigo, por fim, entender a mudança na velocidade de entrega dos meus produtos. Desde a reestruturação produtiva e tecnológica das fábricas, ao aparecimento das chamadas players — as empresas do comércio online — e dos centros de distribuição em pontos estratégicos, Fortaleza vem atuando como um perfeito campo de batalhas. Suas vias estratégicas e largas na periferia, que funcionam como uma teia, são mais eficientes, em termos de circulação, que o traçado em xadrez de seu centro congestionado. E vence aquele que consegue entender isso. Fortaleza é potência logística — ou talvez uma própria cidade-logística, como diria o alemão Markus Hesse.
